sexta-feira, 15 de julho de 2011

A PEC da Bengala maranhense



A Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Maranhão aprovou, na semana passada, dia 28 de junho de 2011, uma antiga Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Estado elaborada pelo deputado estadual Tatá Milhomem (DEM-MA), e que eleva a idade para a aposentadoria compulsória dos juízes maranhenses de 70 para 75 anos. Pelas regras vigentes, ao completar 70 anos de idade, independente do tempo de serviço ou de contribuição para a previdência, os servidores públicos em geral são obrigados a se aposentar. Essa regra se aplica aos membros do Poder Judiciário, por força de disposição contida na Constituição da República, e repetida na Constituição do Estado.
A PEC do deputado Tatá Milhomem pretende alterar a aplicação desta regra aos juízes maranhenses. Na prática, os membros do Poder judiciário do Maranhão, diferentemente dos juízes federais, e dos juízes estaduais das outra 26 unidades da Federação, passariam a se aposentar compulsoriamente apenas aos 75 anos. Essa proposta aprovada recentemente pela Assembleia Legislativa é semelhante a PEC 457/2005, que tramita a Câmara dos Deputados, e que já foi aprovada no Senado Federal. Pela PEC federal, propõe-se a elevação da aposentadoria compulsória dos ministros dos tribunais superiores, e também a permissão, ao critério do legislador, que seja elevada a idade de aposentadoria compulsória dos demais servidores públicos. As propostas têm recebido o apelido crítico de PEC da Bengala.
Em matéria publicada no dia 30 de junho de 2011, sob o título “Ministros do Supremo defendem PEC da Bengala”, o jornalista Rodrigo Haidar, da revista eletrônica Consultor Jurídico (www.conjur.com.br), noticia que a questão foi tratada recentemente por um grupo de servidores com o presidente do Senado Federal, quando foram apresentados números favoráveis à proposta. Na mesma matéria são expostos os pontos positivos e os negativos da proposta, mostrando ainda que alguns ministros do STF já externaram opinião favorável à aprovação da PEC, sendo opositores os órgãos representativos dos advogados e dos juízes.
Em favor da elevação da idade para a aposentadoria compulsória pesa a economia que trará aos cofres públicos. É que, quando um juiz atinge os 70 anos, o estado deverá aposentá-lo, pagando os seus proventos, e ainda contratar outro juiz para exercer aquela função, ficando duplamente onerado. Isso não ocorreria caso o juiz pudesse permanecer no cargo após completar 70 anos.
Outro ponto destacado pelos defensores da elevação do limite de idade, especialmente para o Poder Judiciário, é que as funções de juiz, como magistrado, exigem muito mais a atividade intelectual, que o esforço físico. E mais que isso, quanto mais experiente for o juiz, melhor a qualidade de suas decisões.
Por fim, destacam que as pessoas maiores de 70 anos podem exercer destacados cargos na República, não sendo razoável proibi-los de continuar exercendo os cargos de juízes. Ora, se esta mesma pessoa serve para ser presidente da República, ministro de Estado, senador, governador, prefeito, ou até mesmo exercer qualquer cargo em comissão, não há porque impedi-lo de continuar exercendo o cargo para qual, em regra, logrou exercer por mérito, seja através de concurso público para ingresso na carreira de juiz, seja por escolha dentre os mais notáveis para o acesso aos tribunais.
De outro lado, os críticos da proposta destacam que, mesmo para o Poder Judiciário, aliás, especialmente para a magistratura, não é razoável aumentar a idade da aposentadoria compulsória. É que se faz imprescindível uma renovação na composição dos tribunais. Assim, a permanência por longo tempo na carreira de judicial impede a necessária evolução do Direito, que deve acompanhar a evolução da sociedade. As entidades representativas dos magistrados ainda sustentam que a elevação da idade limite de aposentadoria engessaria a progressão funcional dos juízes, desincentivando os mais novos na carreira, porque reduzidas as possibilidades de acesso aos postos mais elevados.
Outro fator que pesa contra a proposta é a dificuldade na fixação de critérios objetivos para a aposentadoria daqueles que, já nesta avançada idade, não estejam mais em condições físicas e, especialmente, mentais de continuar a exercer as funções judiciais. Por isso, o critério objetivo de 70 anos reduz a possibilidade de juízes permanecerem no cargo sem condições para tanto, já com as suas capacidades físicas e mentais comprometidas.
Independente deste debate, sobre o mérito da elevação da idade para a aposentadoria compulsória, a PEC estadual, do deputado Tatá Milhomem, encontra um obstáculo intransponível à sua aprovação. É que a matéria é inteiramente regulada pela Constituição da República, não havendo espaço para a autonomia estadual sobre este tema. Somente uma alteração na Constituição da República pode tratar do tema.
Está no texto expresso da Constituição da República, em seu artigo 93, VI, que “a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observarão o disposto no art. 40”. E é exatamente o artigo 40 da Constituição, precisamente o seu §1°, II, que determina que os servidores serão aposentados “compulsoriamente, aos setenta anos de idade, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição”.
Assim, por melhor que sejam os propósitos da PEC estadual, de autoria do deputado Tatá Milhomem, a matéria não pode ser tratada pela Assembléia Legislativa do Maranhão de forma diversa do que previsto na Constituição. A aposentadoria compulsória aos 70 anos, inclusive a todos os membros do Poder Judiciário, é uma disposição constitucional de observância obrigatória pelos estados-membros. Quando muito, os deputados estaduais maranhenses poderiam aprovar indicação à Presidência da Câmara dos Deputados, ou à bancada dos deputados federais do Maranhão, para a inclusão da PEC 457/2005, já aprovada pelo Senado Federal, na Ordem do Dia de votação da Câmara. Portanto, se aprovada esta PEC estadual, e promulgada a Emenda Constitucional dela decorrente, não há dúvidas, será inconstitucional, e nenhum efeito poderá produzir.
*Advogado, conselheiro seccional da OAB/MA, presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/MA, e colaborador do site Os Constitucionalistas (www.osconstitucionalistas.com.br). Siga o autor no Twitter @rodlago e no Facebook

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